sábado, 9 de fevereiro de 2013

Livro 40: Casa Velha - Machado de Assis


Esta novela de Machado de Assis foi publicada em 25 episódios na revista carioca A Estação, de janeiro de 1885 a fevereiro de 1886. Sua primeira edição em livro saiu somente em 1944. Uma obra que ficou esquecida durante décadas até ser resgatada para publicação. Em um texto curto, mas com riqueza de detalhes, como toda boa história de Machado, uma temática aparentemente simples começa a fluir e enredar o leitor, prendendo sua atenção.
A história se passa entre os anos de 1838 e 1839. Um cônego, com o intuito de escrever um livro sobre o Primeiro Reinado, dirige-se à casa onde morou um ex-ministro muito conhecido. Ele intuía que na velha casa ele encontraria documentos que o ajudariam na pesquisa. Não imaginaria que a casa traria uma história muito mais interessante do que documentos imperiais.
“A casa, cujo lugar e direção não é preciso dizer, tinha entre o povo o nome de Casa Velha, e era-o realmente: datava dos fins do outro século. Era uma edificação sólida e vasta, gosto severo, nua de adornos”.
Logo o cônego fica amigo da família e presença constante no cotidiano da casa. Tanto a viúva Dona Antônia quanto seu jovem filho Félix, se afeiçoam a ele.
“D. Antônia era antes baixa que alta, magra, muito bem composta, vestida com singeleza e austeridade; devia ter quarenta e seis a quarenta e oito anos.”
Pouco tempo depois, Dona Antônia faz um inusitado pedido: que ele ajude a convencer o filho a viajar para a Europa para estudos. O padre percebe existir nesse pedido algo mais que um simples pedido.
“Era impossível, ou, pelo menos, indelicado tentar obter a razão secreta deste pedido, se havia alguma, como me pareceu. Pus termo à conversação dizendo que ia convidar o rapaz.”
“Félix conservou os olhos espetados em mim, como se quisesse descer ao fundo da minha consciência. Ao cabo de alguns instantes respondeu secamente:- Nada: não posso ir.”
Frequentava a casa uma moça de 17 anos, Lalau, que recebia ajuda de Dona Antônia desde que lhe morrera a mãe.“Tendo ficado órfã desde 1831, D. Antônia cuidou de lhe completar a educação; sabia ler e escrever, coser e bordar; aprendia agora a fazer crivo e renda.”
“Realmente, era uma criatura adorável, espigadinha, não mais de dezessete anos, dotada de um par de olhos, como nunca mais vi outros, claros e vivos, rindo muito por eles, quando não ria com a boca”
Logo o cônego irá perceber os laços que unem o rapaz a Lalau, são mais do que fraternos.
“Amor non improbatur, escreveu o meu grande Santo Agostinho. A questão para ele, como para mim, é que as criaturas sejam amadas e amem em Deus. Assim, quando desconfiei, por aquele gesto, que esta moça e Félix eram namorados, não os condenei por isso, e para dizer tudo, confesso que tive um grande contentamento.”
 A presença da menina também alegra o cônego, que se diverte com seu jeito descontraído e questionador. Travam grandes conversas todas as tardes e a menina é para ele como um ar fresco em meio ao ambiente austero da biblioteca.
 “A simpatia que me arrastava para ela complicava-se agora de veneração, diante daquela explosão de sensibilidade que estava longe de esperar da parte de uma criatura tão travessa e pueril”.
A contradição entre a vontade de ajudar o casal e seus próprios sentimentos pela menina tornam os dias do cônego pesados.
“Já se terá entendido a realidade. Também eu amava a menina. Como era padre, e nada me fazia pensar em semelhante coisa, o amor insinuou-se-me no coração à maneira das cobras, e só lhe senti a presença pela dentada do ciúme. (...) Onde eles viam um simples protetor gratuito existia um homem, que, impedido de a amar na terra, procurava ao menos fazê-la feliz com outro. A consciência vaga de um tal estado deu-me ainda mais força para tentar tudo.”
Tentando ajudar o casal, o cônego acaba recebendo de Dona Antônia uma informação a respeito da origem da moça. Será Lalau filha do ministro ou isso não passa de uma desculpa de Dona Antônia para não ver o filho casado com uma moça de classe inferior?
A história se revela ao fim, traçando o destino do casal.
Casa Velha
Machado de Assis 
L&PM Pocket
Publicação: 1943
Edição: 2012
Quando li: 2013
Como adquiri: comprei para cumprir minha promessa de ler toda a obra de Machado de Assis, um dos meus escritores preferidos.
Nota da Editora:
"Além de notas abundantes e de fácil com­preensão, traz um farto material que possibilita um melhor entendimento sobre o autor e sua obra: uma biografia, uma cronologia, um panorama cultural do Rio de Janeiro e um mapa da época.O autor nunca chegou a ver Casa Velha publicado em formato de livro, o que ocorreu somente em 1944. Classificado ora como romance, ora como conto, Casa Velha narra a polêmica história de um amor incestuoso a partir das lembranças de um padre, que faz um balanço das perdas e ganhos dessa paixão. Por meio dessa obra, Machado de Assis sugere que há um grande paralelo entre as esferas públicas e privadas da vida e mostra como um drama familiar pode ser um retrato acurado do Brasil do século XIX."



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